o limbo

Sempre ouvi falar que pra um ser humano se desenvolver bem e ficar sadio é necessário o contato com outros de sua espécie. Por isso, desde cedo, as mamães levam as suas crias pra brincarem juntas tomando sol (vitamina D) de manhã no parque.

Mas... e se não houver contato? Existem conseqüências?

Eu não era filho único, porém, existia um marasmo de 5 anos me separando da minha irmã mais velha. Dos 0 aos 7 eu me lembro de passar as tardes sozinho em casa.

Não tive coleguinhas, nem lembro direito pq, creio que não havia parque perto de casa.

Ou seja, ora brincava com os meus "Comandos em Ação" (anos 80 que não voltam mais!) ora ficava folheando os livros da Enciclopédia de Animais Ilustrada.

Até que isso enjoou. Daí, como ficava sozinho mesmo resolvi fuçar nos cantos da casa pra ver se achava algo interessante.

A casa é mundo fascinante, incrível! Tem tanta coisa legal pra descobrir, ainda mais se vc for um moleque gordinho e curioso.

Descobri por exemplo, que podia fabricar meus próprios brinquedos.

Desde cedo eu já tinha aprendido a mexer com martelo, serrote e madeira, daí foi só juntar essa vontade com umas tábuas velhas que estavam jogadas na churrasqueira artesanal e pronto! Eu tinha tanques, aviões e robôs japoneses pra brigar com os meus bonequinhos da Estrela.

Eu não sentia falta de amigos. Minha própria imaginação me bastava. Até cogitava a hipótese de trazer algum pra brincar comigo, alias, meu pais tentaram isso, entretanto o meu receio era que o fulano não entendesse direito a brincadeira do jeito que ela era formulada na minha cabeça. Logo, eu estava acostumado com a minha solidão e tinha adaptado quase tudo a ela.

E o tempo passou...

...e chegou a adolescência.

Aí ferrou tudo. Todos os anos que passei no meu limbo particular, cobraram seu alto preço. Eu não conseguia me encaixar nas conversas, as pessoas me achavam metido, tímido, bobo, pois ficava a maior parte do tempo calado ou desenhando coisas.

Minha mentalidade social ainda era aquela do garoto de 6 anos. Desnecessário dizer que isso me fez chegar tarde em um monte de experiências que requeriam mais de um indivíduo para serem realizadas.

Se alguém fosse analisar essa época de minha vida, poderia até dizer que eu era uma criança bastante adiantada com relação as demais de minha idade. No entanto, ao chegar a adolescência veria que eu fui bastante atrasado com relação ao todo.

Ironias...

Pensando nisso tudo, esta semana eu observei a minha irmã mais nova.

Ela tem um quarto cheio de brinquedos. Desde bonecas até uns laptops infantis(um barato por sinal!). Porém, ultimamente ela tem ficado a maior parte do tempo com a minha avó.

Como minha avó estava enferma faz pouco tempo, eu tinha que constantemente levar a pequena de volta ao quarto para ela não estressar demais a velhinha.

Logicamente ela abria o berreiro. Eu tentava argumentar dizendo que ela tinha um quarto cheio de brinquedos e que podia se divertir muito mais ali do que ficando pra assistir novela com a minha avó.

E foi aí que ela, com 4 anos de idade, disse uma coisa que eu só vim constatar quando fiz 16:

"Eu não gosto de ficar só"

Acabei levando-a de volta. E ficando lá com elas. Afinal de contas, nem tudo tem que ser da maneira como nós aprendemos.

Duro foi ter que aturar o fim daquela novela chata...

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